Filho do "Furacão da Copa de 70" está no clube desde 2008, com breve interrupção em 2014. Em maio, ele conversou com o GloboEsporte.com. Confira abaixo o perfil
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Com uma breve pausa em 2014, Jair está no Botafogo desde a temporada de 2008 (Foto: Vitor Silva / SSpress / Botafogo) |
Lá se vão quase nove anos desde que Jair Ventura, 37, desembarcou em General Severiano como estagiário de preparação física. Desde então, conviveu com os mais variados treinadores e jogadores, esteve envolvido em sete decisões de Campeonato Carioca, em um ciclo que foi interrompido no fim de 2013 – demitido pela antiga gestão – e reiniciado no inicio de 2015, quando recontratado pelo clube. Jair já esteve à frente do Botafogo em outras oportunidades. Neste domingo contra o São Paulo, no entanto, será a primeira vez como treinador efetivado.
Neste longo período no clube, Jair trabalhou como preparador físico, técnico do sub-20, treinador interino e auxiliar permanente, seu cargo atual. Se tem uma pessoa dentro do atual departamento de futebol que conhece bem o Botafogo, esse alguém é Jair. Com dois Cariocas na bagagem (2010 e 2013) e convivência com ídolos como Loco Abreu e Seedorf, hoje Jair ajuda a lapidar o jovem time alvinegro. Muitos do atual elenco, como Gegê e Sassá trabalharam com ele nas categorias de base.
Nesses anos de Botafogo, Jair assumiu interinamente o time em duas ocasiões delicadas. No Carioca de 2010, após a goleada de 6 a 0 do Vasco sobre o Botafogo, que resultou na demissão de Estevão Soares, e no ano passado, após a queda de René Simões, quando Jair comandou a equipe em três partidas da Série B antes de Ricardo Gomes assumir. Curiosamente, o Botafogo foi campeão em ambas as competições.
Na véspera da decisão do Campeonato Carioca, neste ano, Jair Ventura teve um longo papo, de quase 40 minutos, com o GloboEsporte.com. Na conversa, ele falou sobre sua trajetória (inclusive como jogador), do pai (Jaizinho Furacão), de suas ideias de futebol e, especialmente, de sua longa relação com o Botafogo.Na ocasião, Jair se disse muito feliz como auxiliar, mas deixou aberta a possibilidade de virar treinador.
- Hoje o Jair Ventura está muito feliz como auxiliar e não pensa em ser treinador. Hoje. O amanhã a Deus pertence - disse Jair, na ocasião.
Neste sábado, com a confirmação da efetivação como treinador do Botafogo, republicamos a entrevista, originalmente publicada no dia 8 de maio. Confira abaixo.
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Jair Ventura conquistou a confiança de Ricardo Gomes e da direção do Botafogo (Foto: Vitor Silva / SSpress / Botafogo) |
Confira outros trechos da entrevista
Trajetória no BotafogoCheguei em 2008, como estagiário de preparação física. Em 2009 comecei como auxiliar. Em 2010 fiz meu primeiro jogo como treinador interino, e logo em um jogo complicado, depois do 6 a 0 para o Vasco. Foi um jogo difícil, com a torcida chateada com razão. O Joel (Santana) tinha sido contratado, mas disse para eu fazer o jogo. Foi contra o Tigres, em São Januário, jogo da televisão, e ganhamos por 2 a 1. Foi um jogo atípico. Primeira expulsão do Leandro Guerreiro na carreira, segunda partida do Loco pelo Botafogo. Eu o tirei durante o jogo. A torcida ficou louca (risos). Mas deu tudo certo no fim, e fomos campeões nesse ano.
EstaduaisDesde que cheguei, fomos vices em 2008 e 2009, ganhamos em 2010, em 2011 não chegamos. Em 2012 perdemos a final para o Fluminense. Em 2013 fomos campeões, mas fui demitido em no fim do ano. Para mim foi meu melhor ano no Botafogo. Fomos campeões cariocas, conquistando os dois turnos e conseguimos a classificação para a Libertadores depois de 18 anos. Mas fui demitido. Voltei em 2015, com esse projeto de levar o clube à Série A, mas conseguimos levar também o clube à final do Carioca.
Retorno em 2015Uma nova oportunidade, um novo momento no clube, cujo principal objetivo era voltar à Série A. É lógico que queremos ganhar tudo o que disputamos. Somos competitivos, somos profissionais. Mas a direção deixou bem claro que nosso objetivo era a volta à Série A. Voltei em um clube em uma situação muito difícil financeiramente, após a saída do ex-presidente (Maurício Assumpção). Foi uma reestruturação total do futebol. Mudou tudo. Eu participei, junto com o Antônio Lopes, o René Simões, o Mantuano (ex-vice de futebol) e o presidente da montagem dessa equipe. Conseguimos montar um time que chegou à final e foi campeão da Série B. Assim como o Ricardo nesse ano, já que o time foi praticamente todo remontando. O que eu acho engraçado, é que nesses anos todos o Botafogo é sempre o patinho feio, sempre dizem que não vamos chegar, e estamos sempre nas finais. Falam que o Carioca não vale nada. Pergunta para o Eduardo Baptista (demitido neste ano pelo Fluminense após derrota para o Botafogo). Vários treinadores são demitidos nos estaduais. Vale muito.
O Botafogo atualTodos os times têm características diferentes. Comparando com o time de 2013, por exemplo, aquela era uma equipe com uma folha salarial muito maior. O Botafogo vivia outro momento, com jogadores renomados, como Seedorf, Rafael Marques, Andrezinho, Fellype Gabriel. Tínhamos alguns garotos como o Vitinho e o Dória. Era uma equipe mais mesclada e badalada. Hoje temos um time muito jovem, mas com garotos com potencial enorme. Perdemos um pouco de experiência, mas ganhamos na competitividade. É um time leve, que corre bastante. Nosso time é muito organizado.
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Jair Ventura comandou o Botafogo em três jogos na Série B após a demissão de René (Foto: Vitor Silva / SSpress) |
Relação com Ricardo GomesÉ um privilégio você trabalhar muito tempo em um clube, já que você pega um pouco de cada treinador. Cada um tem uma característica. Todos nós temos defeitos e qualidades. Tento pegar e aprender o melhor de cada treinador. É um aprendizado constante. O Ricardo tem muitas qualidades. É uma pessoa fantástica. É um cara com um carisma enorme, além de um grande profissional. Isso é unânime. E eu poder participar dessa volta dele ao futebol é muito gratificante. Eu estava em casa assistindo o jogo quando ele teve o AVC (em 2011). Foi marcante, muito triste. Participar dessa volta foi algo diferente e gratificante. Hoje vejo todos elogiando o trabalho dele e é bom saber que tive uma pequena contribuição para isso.
ContribuiçãoO Ricardo é um cara que tem vaidade zero. Ele está sempre dividindo os méritos. No futebol ninguém ganha ou perde sozinho. Ele sempre me elogia. Isso é gratificante. Para nós, que trabalhamos nos bastidores, é importante. Somos invisíveis para o resto do mundo. Ter essa gratidão do cara que a gente ajuda é muito gostoso. Não tem como negar. Fico feliz.
MeritocraciaAprendi muito com o Ricardo Gomes sobre organização tática. E ele coloca para jogar quem está treinando melhor. A gente coloca quem está no melhor momento nos treinos. O jogo é reflexo dos treinos. Não tem preferência por A, B ou C. O Ricardo é muito justo. E ele ganha o grupo com isso. Quem está na reserva não pode ficar satisfeito, mas tem que entender que o companheiro está em um melhor momento. O Leandrinho, por exemplo, esperou bastante e virou titular na reta final. Ele vinha treinando muito bem. O Ribamar subiu para completar treino na pré-temporada e virou a grande sensação do campeonato.
Trabalho com a garotada Muitos desse grupo começaram comigo nos juniores. É o caso do Sassá, do Gegê, do Octávio... Todos foram meus jogadores no sub-20. É muito legal chegar a uma final com jogadores que trabalharam comigo nos juniores. Hoje em dia é difícil essa manutenção do trabalho. No ano passado, quando elogiei o Gegê, apanhei muito por isso. Pedi calma. Hoje ele é titular e está na final do Carioca.
Nota: além do sub-20 do Botafogo, Jair Ventura foi auxiliar das seleções sub-15, sub-17
Fome de títuloTem muita fome, sim. Falar que mais ou menos que os outros grupos, é complicado. Acho que todos tinham. Mas esse é um grupo jovem. Todos querem muito ganhar e marcar o nome na história do Botafogo. Isso marca a carreira de um jogador.
O torcedor Jairzinho (Jair Ventura é filho do Furacão da Copa de 70).Ele acompanha, ele vai aos jogos. Mas ele é pai, né. Sempre nos falamos após os jogos, ele comenta, mas tudo bem informal. Ele é muito torcedor. Torcedor ao extremo (gargalhada).
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Jair Ventura teve passagem pelo futebol francês como jogador. Para ele, ser filho de Jairzinho foi um peso a mais como atleta. Jair desistiu da carreira aos 26 anos (Foto: Arquivo Pessoal) |
Ser filho do Jairzinho te ajudou ou atrapalhou mais no futebol?Não me preocupo muito com isso. Tinha duas opções: ou me escondia e vivia na sombra do meu pai pelo resto da vida ou iria atrás dos meus sonhos. Optei pela segunda. Estudei, me preparei e busquei meu espaço. Talvez tenha me atrapalhado muito na época de jogador. Fui um craque? Não. Mas havia jogadores medianos que não eram filhos de ex-jogadores. Quando eu perdia um gol, como todos outros atacantes perdiam, diziam que eu só estava ali porque era filho do Jairzinho. Tive essa pressão até os 26 anos, quando deixei o futebol e fui estudar educação física. Mas ser filho de um grande ídolo, não tem preço. É um grande ídolo como profissional e como pai.
Futuro como treinador?Hoje estou muito satisfeito com a minha função. Eu gosto de ser auxiliar. É claro que vai ter um momento que eu não terei mais opção e terei que seguir o meu caminho. Mas hoje estou muito feliz no Botafogo. Hoje o Jair Ventura está muito feliz como auxiliar e não pensa em ser treinador. Hoje. O amanhã a Deus pertence.
Carreira como jogadorComecei no São Cristóvão, passei pelo Bonsucesso, dois anos no Bangu, um ano França, voltei para o Mesquita, depois passei uma temporada na Grécia, depois foram dois anos no Gabão. Lá, tentei me naturalizar para jogar a Copa de 2002, mas não consegui. Aí voltei para o Brasil, aos 26 anos, e disse chega. Corri atrás pra caramba, passei por muitas dificuldades, e resolvi seguir outro caminho.
Essa entrevista foi originalmente publicada no dia 8 de maio deste ano.
Fonte: GE/Por Marcelo Baltar e Thiago Lima/Rio de Janeiro